segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Experimentando a ficcção

Vamos ao que interessa.

Enquanto o morno banho caia nas costas, a ducha não sabia se esfriava ou se queimava. Essa intermitência dos dias de verão inverno da ducha deixam qualquer natureza, no mínimo sem certezas. No mesmo instante que a água diminuiu de conteúdo e a luz estremeceu um pouco querendo o falhar, um barulho veio vindo veio vindo veio vindo por cima da cabeça que estava embaixo da água.

Um barulho imenso que passava o barulho da água que caia na cabeça que parecia uma cachoeira mas o barulho parecia ser mais que o barulho do barulho da água. Que não era cachoeira. Que também não era frio nem calor. Mas frio. E também calor. E veio vindo e aumentando. Eram hélices imensas, que faziam o vento lá fora cantar mais alto do que já ventava desde cedo. As flores começaram a cair todas da árvore. Não se sabe se sim, mas se tem certeza. Ou não, afinal isso aqui é uma ficção. Então pode ventar e as flores não caírem.

E o barulho veio entrando pela mísera fresta do vitrô do banheiro, meio quente pelo mormaço da água, mas também meio frio pela corrente de vento formada com o resto da casa. E veio vindo. Aumentando. As hélices girando e girando em preto. Girando girando girando em preto. E a névoa que cobria a redoma do banheiro foi se dissipando. Virou uma tormenta, daquelas de muito bom gosto. O barulho alto e alto e cada vez mais baixo e baixo, perto dos ouvidos.

StUUUuuuuUUUUUuuuuuuuUm.

Fez-se silêncio.

Barulho para dentro do vácuo, um barulho em silêncio. Semelhante a legenda quando daquela cena da explosão da bomba de hiroshima.

Dalí, Salvador.

Uma transfusão de sangue e por segundos vendo lá de cima. Toda a cena lá embaixo. A linha da vida, as respostas para todas as perguntas, as palmas ou os choros para todas as escolhas, as risadas de ironia para todas as incertezas, e assim, do começo ao fim, uma curta vida de poucos segundos. Com todas as rodas gigantes rodando e rodando para dentro do parque, para fora do gigante da tormenta. Encontrando todas as soluções, achando todos os caminhos, fazendo apenas escolhas certas e depois tendo certezas das certezas. Fácil assim. Uma pílula com todas as luzes para se tomar em um só gole.




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