Tem dia que parece que você envelhece uns 80 anos, fica da cor do bigode ultrapassado.
Tem horas que parece que você rejuvenesce uns 18 anos, fica com espinha que nem o adolescente no cinema. Tem noites que você dorme até colar seus sonhos no travesseiro, e acorda suando de tanto que correu para conquistar. Tem dias que parecem noite, que tudo fica escuro, chove dentro de você, e deságua lá na sarjeta. Tem noites que parecem dia, tudo não tem fim e o mais longe é tentar enxergar aquela estrela que nunca brilha.
Tem 28 anos que não cabem na calculadora de ninguém e tudo é motivo de questionamento. Nome, peso, altura, profissão, relacionamento, cidade, férias, viagem, pessoas, rumo, história, comidas, salário, preço, sonhos, diálogo, família, academia, distâncias, saudades, ódios, amores, relógio, horas, gastos, dormir, acordar, porquê, porquê, porquê daqui, de lá de acolá. Culpa, raiva, canseira e dor.
Os sabores do sorvete são muito, daí até isso é questionável. A cadeira do bar é ruim de sentar, a fila na entrada da balada, o atendimento da padaria, o jeito que vem o troco, os laços que você mantém, você questiona tudo. Reclama de muito, tem certeza de quase nada, mas absoluta do que já não quer mais ter.
É uma sensação de pisca pisca, pisca apaga, pisca acende.
Pisca apaga
Pisca acende
Pisca apaga, acende, apaga, acende.
Vem o corpo e pede pra descansar.
Vem a alma e pede pra viver.
Vem o espírito e pede para orar.
Vem os outros e pedem resultado.
Vem a saúde e pede exercício.
Vem as redes sociais e querem atualização.
Vem o círculo social e pedem participação.
Vem o silêncio e fica falando e não te deixa dormir.
Vem a alimentação e te cobra caro.
Vem o vazio e pede solução.
Em quantos 28 anos se divide uma vida?
Mas vem o mar e me chama, lá longe, para mergulhar.
Tinha um moço revirando o lixo, na rua pela qual passei. Mas o lixo não era lixo. O lixo tinha uma mala. Ele olhou, virou, deixou o cigarro pendurado na boca enquanto averiguava exatamente se aquela mala tinha rodas, ziper, costura e se realmente precisava estar ali, no lixo. Demorou tanto para fazer a vistoria que não dei conta de esperar, virei a esquina apertada pro xixi. Tenho certeza de que ele precisava colocar ali dentro alguma coisa, alguma passagem de ida, alguma casa, alguma família, alguma viagem, algum sabor, alguma escolha do querer carregar algo para algum lugar. Algo que valha a pena.
Tenho me perguntado, cada vez mais, o que quero carregar dentro da minha mala, para algum lugar.